Atenção : contém spoilers !
Alice é uma obra que permite várias interpretações. Uma delas é a de
que as mudanças, conflitos e aprendizados da adolescência podem estar
representados na obra. Alice entra na aventura sem pensar em nada, de
repente, como se entra na adolescência. A questão do tamanho nos lembra
que a adolescência está presente em todos os episódios da história:
“Alice está sempre crescendo e diminuindo dependendo da situação e isso
certas vezes é conveniente ou não para ela”.
Alice no País das
Maravilhas é um dos livros mais editados da literatura moderna e
influenciou vários grandes escritores, como Jorge Luis Borges, Cortazar,
Maria Clara Machado e Guimarães Rosa. Um romance extremamente complexo
que propõe as mais variadas interpretações por abordar em seu contexto
assuntos de diferentes temáticas.
Os dois romances de Lewis
Carroll (pseudônimo de Charles Lutwidge Dodson), Alice no País das
Maravilhas e Alice Através do Espelho, publicados em 1865 e 1872, são
extremamente intrigantes e capazes de mexer muito com a imaginação de
seus leitores.
Os elementos típicos dos contos de fada, animais
que falam, reis e rainhas, mudanças de tamanho em um passe de mágica,
personagens enigmáticos que aparecem e desaparecem de uma hora para
outra, além do fato da história se passar dentro de um sonho, torna tudo
muito complexo e curioso.
Alice no País das Maravilhas é a
narrativa do sonho de uma garotinha. Como é comum em todos os sonhos, as
regras da realidade são quebradas e isso é analisado pela própria
personagem como em um jogo. A garotinha precisa entender e resolver o
jogo, antes que sua irmã a acorde e a traga de volta ao mundo real e
normal.
No primeiro capítulo, Alice reduz de tamanho e parece se
tornar insignificante. Essa transformação faz com que ela tenha medo de
encolher até desaparecer. Em alguns episódios, Alice cresce de forma
desenfreada. O adolescente se sente insatisfeito, ao perceber que
crescer traz consigo inúmeras responsabilidades.
Em várias
circunstâncias o tamanho representa novas possibilidades. Pequena, Alice
pode entrar no jardim, mas grande, pode pegar a chave. Grande, sente-se
mais confiante no julgamento no final do livro.
Na passagem em
que o pescoço de Alice cresce, sua capacidade de observação se torna
mais ampla. Depois de experiências vividas na adolescência passamos a
ter uma nova visão do mundo. Alice considera o país das maravilhas mais
divertido, mas sente saudades do mundo real. O adolescente adora as
novas possibilidades dessa fase, mas sente saudade das facilidades da
vida enquanto criança.
No país das maravilhas, Alice sente que
pode usar a mágica como recurso para tornar-se invencível. Ao afirmar
que quando for adulta vai escrever um conto de fadas, revela o desejo de
controlar tudo que acontece no mundo a sua volta.
Quando Alice
fala sobre a dúvida de quem realmente é, no diálogo com a cigarra, a
personagem demonstra um estado confuso típico da adolescência diante da
rapidez com que as mudanças acontecem.
Ao final
do livro, Alice recupera seu tamanho normal, porém a maturidade vinda
das experiências vividas ao
longo da história a investe de uma grande coragem para enfrentar o
julgamento. Quando Alice acorda, sua irmã pensa se ao crescer ela
conservará o coração simples e amoroso da infância. Lembra alguém que
passou pela adolescência e se lembra dela com saudades. Nesse momento, a
irmã de Alice percebe que ela despertou do sonho muito mais madura.
As mudanças de tamanho mexem com o
psicológico da personagem, levando-a a explorar suas capacidades,
enquanto impõe novas circunstâncias a cada capítulo, fazendo o romance
progredir.
Tome-se por exemplo um dos episódios iniciais em que
Alice está num grande salão e identifica uma porta pequena na parede,
antes escondida por uma cortina. A menina então encontra uma chave
minúscula, sobre a mesa de vidro, e abre a portinha, revelando um belo
jardim. Sua intenção é chegar àquele novo lugar.
O problema do
tamanho lida com o crescimento e os obstáculos encontrados no caminho
para a maturidade. A personagem busca se superar diante de cada
obstáculo desenvolvendo a postura de uma heroína e nem mesmo a sua
constante crise de identidade a impede de continuar questionando e
desejando mudar seu tamanho para ultrapassar portas e adentrar recintos
novos. A última mudança acontece espontaneamente, talvez porque Alice
estivesse prestes a voltar à realidade.
Por : ANDRÉIA CRISTINA DOS SANTOS
Saiba mais sobre a nossa mais nova colunista : Docente no SENAC em Botucatu, psicóloga formada pela USC/Bauru e pós graduada em Psicossomática pela FACIS/SP. Já trabalhou como psicóloga em um abrigo em Itaí ,na Fundação Casa em Iaras e atualmente ministra aulas no curso Aprendizagem em Avaré pelo SENAC.
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